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Crítica Cinematográfica

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CORVO DE GESSO 2020

Filme A gota

Um minuto; qual o tempo necessário para cativar um expectador? Um minuto, foi o que necessitou o curtametragem “A Gota”, com direção de Bernardo Silvino, fotografia de Breno Santo e participação de Claudio Marcio. Extremamente intimista e cotidiano, “A Gota” retrata o pensamento humano, o diálogo com o eu, as crises existenciais advindas do subconsciente e que ganham voz no imaginário sensível do ser. Uma história e um pensamento individual, o qual foi retratado, ganha caráter universal. As mesmas questões que a narradora permeia em sua fala, não raro, são nossas questões, tangendo o emocional do público e o afetivo. As cenas, retratadas dentro de um banheiro anuviado pelo vapor do chuveiro de água quente, nos transmite uma sensação de surrealismo, o mundo dos sonhos, onde o pensamento é supremo e a racionalidade coadjuvante. A emoção está fortemente presente na cena, não sendo transmitida por meio da expressão da personagem, única testemunha do contexto; mas sim, por meio, da fala, do ambiente e da entonação da narradora. A sensibilidade é preponderante, ali, entre quatro paredes, em um banheiro, na hora do banho, despidos de convenções e máscaras sociais, resta o que somos em essência, como seres humanos. Como bem preponderou os escritores do Realismo como Flaubert, o ser humano tem fascinação pela vida cotidiana de outrem, por observar o outro em sua vida comum. Não somos todos expectadores da vida? Somos protagonistas em nossa total insignificância ou estamos conformados em expectar a vida alheia projetando nossos almejos particulares? Assim vemos o adentrar do expectador nesse momento da cena, para observar uma pessoa, que está pensando sobre si e seu entorno, representando a necessidade do ser de se encontrar observando o próximo, “quando eu olho para o outro estou procurando a mim”. Simples, real, e até palpável. Quando a personagem que tem sua silhueta explorada na imagem, limpa o espelho embaçado do banheiro, vêse sua expressão refletida, a angústia do pensamento se transforma em reflexão, ela sorri como se tivesse chegado a uma conclusão, não otimista, mas uma conclusão, uma pergunta em aberto. E o sorriso da personagem em cena, chega a ser reconfortante como uma mensagem de resiliência e resignação perante os pensamentos inquietos do ser. O curta é extremamente convidativo e magnânimo, convida o expectador a reflexão e te prende pela narração, pelo desenrolar das ideais interpostas e pela calmaria com que os pensamentos são narrados. Por meio da composição da cena, um banho quente, reconfortante, nos sentimos na zona de conforto fisicamente, com o fervilhar de pensamentos, explorando a psique humano de um jeito simples e sensível.

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LARA SILVA 

@alarasilva_

Graduanda em Jornalismo pela Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP). Áreas de interesse: Fotografia, crítica cinematográfica e jornalismo cultural.

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CORVO DE GESSO 2020

Filme O apartamento da velhinha

Síndrome de Estocolmo ao revés, seria uma denominação apropriada para o curta “O apartamento da velhinha”. Com direção e roteiro de Pedro Garcia, produção de Ácacio Silveira Ribeiro e atuações primorosas de Miltinho Ribeiro e Rosa Tatuada, o curta se desenvolve a partir de um acontecimento anterior não retratado no filme, mas entendido pelo espectador, por meio, do desenrolar dos fatos. Abruptamente, um homem entra em um apartamento e no local se depara com uma senhora e uma criança de colo; os diálogos e pensamentos que se seguem são o primor do filme. Uma ambientação extremamente cotidiana e real, é o cenário para a construção e o desenvolvimento de falas e reflexões primorosas e profundas entre os personagens, a velha e o homem; sem nenhum preciosismo linguístico ou acadêmico, as trocas entre os dois personagens são simples e de um alto teor existencial, os quais, ganham o espectador por sua fluidez, dinamicidade e sobretudo simplicidade. A cozinha representa a ambientação de uma das cenas, onde os personagens interagem. Sendo ela o “útero” da casa, é onde são gerados os primeiros pensamentos e diálogos entrelaçados dos dois personagens; a velha fazendo um café, diz muito e o homem a escuta. Você está morto! É essa uma das afirmações que ela nos traz e repete diversas vezes durante o filme; parafraseando-a: está morto e está preso no purgatório. Ele acha comicidade das falas; é claro que não estaria morto, sentia o doce do café e sua testa sangrava, sangue é advindo da carne humana, corpo vivo, que pulsa sangue; não, não estava morto! Velha maluca! Os arquétipos: o pecado representado no homem, a velhice na senhora e a juventude na criança de colo, essa seria a representação do purgatório? O curta está nos apresentando uma narração factual e humanizada do purgatório? Buscando retratar o transcendental, por meio, da simplicidade dos diálogos cotidianos? Ou o filme é representante dos gêneros de ação e drama com momentos de diálogos mais intimistas, mas preponderantemente um filme de ação em que o espectador se aflige porque quer a mocinha com vida e que o vilão seja capturado. A grande questão do filme se apresenta justamente nisso, a proposta paradoxal! A partir de uma ótica maniqueísta, o espectador pode seguir dois caminhos distintos para a interpretação do filme, o místico ou o real. A velha era um ser místico que habitava o purgatório ou estava fazendo brilhante uso de sua persuasão e dialética para acessar o psicológico daquele homem manipulando-o a fim de sair da situação delicada em que se encontrava? Deixando de lado o maniqueísmo, temos um curta extremamente amarrado, o desenvolvimento dos fatos e os diálogos. A interpretação da conclusão e do que ocorre no filme, é aberta, subjetiva e cabe ao espectador fazê-la. Não existe demagogia na proposta do curta, é amplamente difuso o que se pode entender do filme; por esse fato, que “O apartamento da velhinha” é angariador de reflexões. Sem “lentes” materialistas e céticas, ou mesmo misticismos demasiados, o espectador que assistir o curta sem dúvida será impactado pela profundidade e austeridade de uma obra inventiva.

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LARA SILVA 

@alarasilva_

Graduanda em Jornalismo pela Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP). Áreas de interesse: Fotografia, crítica cinematográfica e jornalismo cultural.

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